Já escrevi vários artigos falando do contato entre duas pessoas através da emoção e não apenas da razão. Esse tema não se esgota facilmente porque é o centro das inúmeras dificuldades no relacionamento afetivo. Ainda hoje algumas pessoas descrevem esse contato como sintonia (estar na mesma frequência) e os mais jovens preferem conexão (estarem conectadas). Há a “química” e o “clima” (rolou um “clima”). Há o “estar presente”, “estar inteiro” e tudo isso é “sentir” o outro. De fato ou falamos da razão para a razão e da emoção para a emoção, ou estaremos falando em idiomas diferentes e não nos entenderemos.
Somos animais racionais e usamos a razão, mas também nossa emoção (mesmo a mais instintiva/animal) influencia nosso comportamento, isto é, somos também seres emocionais. Conforme descrevi no artigo para a revista Psiquê, nº 55 “As Dificuldades Atuais do Relacionamento Afetivo”, há pouco mais de 200 anos exercitamos a escolha de nossos cônjuges e, ao menos explicitamente, o fazemos afetivamente.
Nossa complexa sociedade atual, no entanto, vem enfatizando a importância do nosso lado racional e acabamos, hoje, por negar, ou ao menos depreciar, nosso “mundo” emocional. Apesar disso nos casamos por amor. Gostemos ou não somos incoerentes.
Há boas razões para que as coisas sejam assim: a emoção é instável e por isso se fala em amor verdadeiro! As emoções disputam, frequentemente, com a razão. A sociedade precisa da razão e odeia a emoção! Sim. Assim somos nós. Mesmo que nos julguemos visceralmente racionais, são as emoções que determinam boa parte das nossas escolhas.
Encontramos uma distinção nítida entre os gêneros: as mulheres guardam (ainda) a emoção como um valor (apesar de estarem lutando contra isso) e os homens se orgulham de serem prioritariamente racionais.
O fato indiscutível é que as pessoas que se apaixonaram amam esse estado emocional (quando não o odeiam por motivos bem específicos). Um segundo fato indiscutível é que é a paixão (emoção), que determina a escolha de um par para um relacionamento que (espera-se) seja de longa duração.
O que acontece depois é que, as pessoas se unem e em poucos anos vão perdendo a sintonia, a conexão e, pior, o vínculo.
Na grande maioria dos casos (ao menos os que eu acompanho) o motivo dos desentendimentos que surgem é por falarem idiomas diferentes: um busca sintonizar o outro no idioma emocional e o outro prefere, logicamente, se manter no idioma que mais domina: o racional. Eles precisam escolher um único idioma para que possa se entender; qual escolher?
Primeiro critério: origem. Se o relacionamento nasceu em bases racionais deve-se manter no idioma racional, ou quem pretende mudá-lo para o emocional precisa convencer o outro quanto às vantagens dessa mudança. Se o relacionamento nasceu em bases emocionais deve-se manter no idioma emocional, ou quem pretende mudá-lo para o racional precisa convencer o outro quanto às vantagens dessa mudança.
Segundo critério: destino. Se o relacionamento tem como objetivo atender necessidades concretas, objetivas, racionais, escolhe-se o idioma racional. Se o destino do relacionamento é atender necessidades emocionais, afetivas, subjetivas, criar um espaço seguro e nutriente de compartilhamento, ter prazer fora do ambiente externo racional e competitivo, escolhe-se o idioma emocional.
É comum também que um componente do casal perca um idioma: já não consegue sintonizar-se ao outro, já não há conexão, não se olham nos olhos, não se beijam demoradamente, não conseguem divertir-se se estão sozinhos, se tentam fazer carinho parece mais que estão ajeitando a roupa um do outro (!); não se sentem amados um pelo outro. É hora de conversar e escolher o idioma que vão falar.
Não há dificuldade em recuperar um idioma já utilizado. Algumas pessoas sentem como se isso fosse impossível. Não é. Basta querer (e se dedicar).
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