Já ouvi diversas descrições de felicidade sendo que uma boa parte delas menciona “paz”. Bem, paz é o que nos falta nestes tempos atribulados.
Eu me sinto incomodado quando pessoas que desconhecem a felicidade resolvem falar ou escrever sobre ela. Abra o Google e procure “Felicidade” e associe com “efêmera”; você poderá encontrar vários textos tentando te convencer que a felicidade não é possível; não pode ser alcançada.
A felicidade no entanto é possível. Cada pessoa entende ao seu modo a felicidade. Algumas pessoas acham que a alegria é superior à felicidade porque a alegria nos coloca mais “para fora”, somos mais expansivos. Essa é uma distinção importante: na alegria compartilhamos o sentimento com outras pessoas, já a felicidade pode ser completamente solitária.
Algumas pessoas ao se sentirem infelizes buscam o prazer. Prazer é uma outra coisa. É bom mas não se liga com a felicidade. Prazer é mais sensorial e pode estar ligado a sentimento que se apoia em coisas concretas como, por exemplo, o prazer ao ganhar ou comprar um objeto desejado. Algumas pessoas podem dizer da “alegria” ao ganhar o primeiro carro, mas esse sentimento está mais próximo do prazer e mais longe da felicidade.
Temos então:
prazer – físico, o mais frequente, associado aos órgãos dos sentidos (comer, beber, ouvir, ver, contato físico/pele), podendo subir um pouco na escala atingindo as emoções, mas ainda ligado a coisas/objetos.
alegria – frequentemente ligada a pessoas e objetos, tendendo ao contato (emocional). O exemplo mais simples e frequente é a alegria que sentimos em uma festa, onde estamos com pessoas que também estão sintonizadas nesse sentimento. Tanto a alegria como o prazer são absolutamente transitórios por se apoiarem em situações/condições específicas/pessoas/objetos.
felicidade – existe em um âmbito mais pessoal e em nível mais profundo, podendo não se apoiar em nada que seja concreto ou objetivo; pode ser puramente subjetivo, apesar de poder se associar também a determinadas condições objetivas. Em outras palavras a felicidade é apenas o sentimento de uma pessoa, independente do que lhe é externo.
As pessoas são diferentes e, por isso, algumas buscam prioritariamente o prazer, outras preferem a alegria e, algumas outras desejam a felicidade. Diante disso surgem algumas perguntas:
1 – De qual desses sentimentos/sensações você sente falta?
2 – Qual desses sentimentos/sensações você considera mais importante?
3 – Qual deles você acha que precisaria alcançar?
São inúmeros artigos falando sobre a felicidade e sempre transmitindo uma visão pessoal. A Felicidade fica, por isso, como se fosse uma questão de opinião, como na religião ou política. Ocorre que a Felicidade não é uma crença nem uma associação, mas o nome de um sentimento e precisa ser tratada de forma mais técnica.
No Zen encontramos a frase “Quem sabe não fala, quem fala não sabe, para indicar que a pessoa que atingiu o Satori, caso tente descrevê-lo para alguém, parecerá louco, pretensioso, desequilibrado ou algo parecido, simplesmente porque as palavras não conseguem definir com precisão a magnitude da experiência emocional.
Isso é compreensível, porém as pessoas que desconhecem a felicidade afirmarem que ela não existe ou que ela é assim ou daquele outro jeito, é no mínimo temerário.
Vou citar como exemplo dois artigos escritos por pessoas idôneas e que merecem respeito, mas que infelizmente não escaparam desse lugar comum.
O primeiro é Stephen Kanitz. Por ser voltado para o mundo contábil, podemos até aceitar que tenha essa visão e empregue o óbvio “efêmero” para qualificá-la.
O segundo é do psicanalista, escritor e educador Rubem Alves, publicado na revista Psiquê – Ciência e Vida – n. 28, sob o título “A difícil Arte de Ser Feliz”. Rubem Alves fala da felicidade em vários dos seus textos mas neste especificamente diz: – “Não é possível ser feliz. O máximo que os deuses nos concedem são momentos de alegria…”.
O Frei Leonardo Boff vai nessa mesma linha e indica a “dialética” como caminho e explicação. O filósofo muito admirado e professor, Mario Sergio Cortella, tem um vídeo circulando na internet onde começa afirmando que a felicidade é transitória.
O maior estudo já feito até hoje sobre esse tema acompanhou a vida de 724 pessoas por 75 anos em seus diversos aspectos (trabalho, relações, condição financeira, saúde, etc.) e concluiu que as pessoas mais felizes são aquelas que vivenciam mais as suas relações, ao contrário das mais solitárias.
É um excelente estudo se comparado a outros que buscam identificar com qual faixa de ganho mensal as pessoas são mais felizes (sim, há um estudo destes também!) pena que a conclusão deixa ainda dúvidas: Basta a pessoa estabelecer relacionamentos e será mais feliz? A confusão é enorme: No filme À Procura da Felicidade Will Smith refaz na tela a vida de Chris Gardner, de sem teto à milionário; à partir disso deveríamos concluir que o filme deveria se chamar À procura do Dinheiro! Chega a ser ridículo!
Caso uma pesquisa busque pessoas que são encontradas olhando para o céu é possível dizer que elas serão mais felizes que a média da população? Provavelmente sim; veja: Imagine 3 dessas pessoas encontradas olhando para o céu: uma delas é um homem que olhou para o céu tentando identificar se havia nuvens de chuva e, nesse caso deveria ou não sair levando um guarda-chuva; uma outra seria uma criança que olhava as nuvens buscando associar o formato delas com animais, objetos conhecidos e a terceira seria uma pessoa que olhou para o céu para ver as nuvens, as cores, apreciar a natureza. Provavelmente seriam encontradas poucas pessoas olhando para o céu tentando identificar a situação climática porque esse olhar é muito rápido. Crianças olhando nuvens seriam mais encontradas porque elas podem passar muito tempo nessa atividade e, como se divertem com isso, podem estar alegres e/ou felizes. Uma pessoa que olha para o céu como quem aprecia uma obra de arte… tende a ter sentimentos de felicidade com mais frequência! Independente das posses, da condição de saúde uma pessoa pode apreciar coisas simples e sem custo e ter o sentimento de felicidade. (porque a felicidade é um sentimento).
A felicidade contém o prazer e a alegria de estar no mundo e isso significa “ser”. Ela implica em aceitar-se; admitir-se como uma pessoa com qualidades (e falhas). Esse conjunto de coisas pode ser ressaltado através de nossas relações! São as outras pessoas que nos aceitam e com isso nos afirmam que somos aceitáveis. São as outras pessoas que podem nos amar o que nos afirma que temos um significado. Podemos buscar essa afirmação ao comprar um carro novo e ver a admiração (ou inveja) de nosso vizinho, mas isso é superficial e transitório; teremos que impressioná-lo frequentemente com novas aquisições.
Por isso podemos dizer que podemos ser mais felizes estabelecendo um relacionamento amoroso com uma pessoa que nos é “especial” e diversos outros relacionamentos também cheios de afeto e, ao apreciarmos essas interações estaremos acessando nossa vida emocional e poderemos ter sentimentos de felicidade.
Podemos pensar então que dessa forma a felicidade será transitória. Relativamente sim, mas nunca efêmera. Há sim a felicidade estável, mas isso é assunto para outros textos (busque por “Amor, Emoção, Casamento).
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