Com muita facilidade você vai encontrar pessoas recomendando não idealizar o relacionamento, falando do perigo de idealizar e criticam o amor romântico. BESTEIRA! Isso é dito por quem tem uma visão superficial do ser humano ou quem sofreu muito e escolheu viver uma vida árida! Árida no aspecto emocional. Veja:
Cada ser humano nasce potencialmente capaz de falar dois “idiomas”: a linguagem racional e a emocional.
Frequentemente misturamos esses dois idiomas mesmo em nossos pensamentos e isso nos leva a conclusões muito erradas e aí sim há perigo! Se acrescentarmos a possibilidade de termos pontos cegos em nosso campo de visão, isso potencializa a possibilidade de (grandes) enganos, como ocorre na adolescência quando, junto com as grandes erupções emocionais, temos também as coisas concretas, objetivas, racionais, do mundo adulto.
Vou exemplificar essa falha através de alguns pensamentos, atitudes e expressões bastante frequentes:
Amor Verdadeiro: Começo com este exemplo por ser bem simples: duas palavras sendo uma de cada “idioma”. “Amor” é um sentimento o que implica em estarmos falando de emoção, o que nos remete à linguagem emocional. “Verdadeiro” é uma palavra clássica da linguagem racional sendo a busca da “verdade” o pilar da ciência (a comprovação) e da antiga filosofia (silogismo aristotélico), estando implícita no clássico “CQD” da matemática. Usando duas palavras de idiomas diferentes em uma expressão, o entendimento ficará prejudicado. “Amor verdadeiro” não existe, isto é, não faz sentido. O amor (sentimento) existe e isso implica que ele é “real”, porém quando se diz “verdadeiro” estamos pensando (racionalmente) em estável e/ou imutável, permanente, etc. (e não real) e isso é incoerente com a emoção já que esta não é estável nem imutável. Em função disso pode-se pensar:
O Casamento não dá certo: Ou “o casamento não funciona”. Não dá certo mesmo e isso pode ser analisado juntamente com outra afirmação adolescente:
A monogamia não é natural ao ser humano: Não é mesmo. A monogamia foi desenvolvida e implantada pelos recursos intelectuais (racionais/sociais) na instituição do casamento que, hoje, é definido, na maioria dos casos, pelo “gostar” (linguagem emocional). Gostar e casar são palavras de idiomas diferentes e isso precisa ficar muito claro. Então:
Gosta-se e só; não se evolui ao casamento, contando que a emoção não é estável e, provavelmente, em algum tempo se vá gostar de outra pessoa e assim sucessivamente.
Gosta-se e se casa e:
Não se busca sustentar o relacionamento segundo os requisitos emocionais e sim busca-se sustentar o relacionamento apenas sob as regras racionais (contratuais) do casamento (fim da emoção). Sente-se a carência afetiva e/ou desenvolve-se um relacionamento áspero ou burocrático.
Não se busca sustentar o relacionamento segundo os requisitos emocionais nem sob as regras racionais. O casamento acaba.
Busca-se sustentar o relacionamento segundo os requisitos emocionais e também segundo as regras contratuais racionais do casamento. O relacionamento perdura, funciona, prospera. O casamento não dá certo, mas o casamento amoroso funciona e muito bem. A monogamia não é natural no ser humano, a monogamia é uma oferta racional (consciente conforme indiquei no meu livro “Laços e Nós, a construção de um relacionamento de alta qualidade”), um símbolo que se oferece ao relacionamento para lembrar-nos do compromisso (racional) de sermos amorosos (emocional) no relacionamento.
Os homens são… As mulheres são…: Os homens são iguais em alguns aspectos assim como as mulheres são iguais em alguns aspectos. Os homens são diferentes em outros aspectos assim como as mulheres são diferentes em outros aspectos. Justificar as opções pessoais sob a afirmação que “os homens são” ou “as mulheres são” só quer dizer que há uma incapacidade de resolver questões íntimas de si mesmo.
A união da emoção (amor) às normas sociais vigentes é o comportamento amoroso e é ele que pode fazer com que cada amor seja único, “infinito enquanto dure” (Vinícius de Moraes) e sim, se nos propormos a distinguir essas linguagens, conhecer ambas, podemos pensar em um relacionamento ideal e lutar por ele! Não aceite o mínimo; queira, deseje mais, queira o melhor, mas trabalhe para construir isso. Busque o melhor, o ideal e haja nessa direção.
Aprendemos a pensar, aprendemos a lógica, acumulamos informações, mas não aprendemos a olhar para nossas emoções e sentimentos, ao contrario aprendemos a desconfiar delas! O prazer é uma emoção e… você quer vver uma vida sem prazer? Ou uma vida só com os prazeres mais simples, básicos, quase materiais (comer, comprar)?
Viver só em um mundo de prazeres não é bom, só de alegrias também é pobre, só contemplativo é também improdutivo, mas um mundo sem prazer, alegria e apreciação é muito árido!
Abrindo nossa percepção para apreciar o bom, o belo, o intenso é que percebemos o que é amar e sentimos isso nas canções populares (se nos damos a esse trabalho) e destaco aqui a canção dos Beatles provavelmente escrita pelo Paul McCartney, Till there was you, onde ele diz:
Havia sinos naquela colina
Mas eu nunca os ouvi tocando
Não, eu nunca os ouvi mesmo
Até você aparecer
Havia pássaros no céu
Mas eu nunca os vi voando
Não, eu nunca os vi voando mesmo
Até você aparecer
Espero que você já tenha vivido essa experiência de, de repente, enxergar coisas que nunca tinha visto apesar de já ter olhado para elas muitas vezes; dá a impressão de que o mundo cresceu, se ampliou, mas na verdade foi você que cresceu pois se tornou capaz de ver, ouvir, perceber mais coisas. É isso que a paixão faz conosco e… nos encanta. O perigo não está nessa ampliação da nossa capacidade perceptiva e sim em atribuirmos ao mundo essa ampliação e não a nos mesmos! Precisamos entender que nós somos capazes de enxergar mais, perceber mais, sentir mais… amar e não que isso vem de fora (do sino, dos pássaros, da outra pessoa) do mundo externo! É você que é capaz ou não de amar!
O relacionamento pode ser pleno de amor, indescritível, infinito (como disse o “poetinha” Vinícius) e, contrariamente ao seu verso “que não seja eterno, posto que é chama” ele pode ser eterno, se houver ação consciente (racional) para sua manutenção,utilizando a linguagem emocional, a percepção. Nunca será verdadeiro, no sentido racional do termo; será sempre uma emoção, uma forma (emocional) de olhar!
A questão, dessa maneira, se torna simples: Você separa seu mundo racional do emocional (no quanto isso é possível) e vivencia o mundo racional (trabalha, planeja, constrói) e também o emocional (curte, aprecia, se entrega) e pode, dessa forma, escapar dessa confusão que pode levar a relacionamentos produtivos ou ásperos, confusos, mas nunca saborosos, nutrientes e completos.
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