Caso vivamos em um estágio emocional que não nos exija a crença em fantasmas que se materializam neste nosso mundo, podemos passar para um estágio de total descrença do que nos pareça imaterial.
Sempre que essa objetividade e pragmatismo são dominantes em nossa vida é possível que percamos a sensibilidade para ocorrências sutis e por isso alguns “fantasmas” nos dominem.
Podemos sim viver sob um “encosto”, isto é, o “fantasma” de um sentimento que foi gravado em nós por uma vivência que tivemos há décadas, que permanece fora de nossa consciência a maior parte do tempo, e que se apossa de nossas ações sempre que nos defrontamos com uma situação que nos remete àquela já vivida. Não é raro vivermos sob o domínio desses “fantasmas” do nosso passado.
Tenho uma dica simples para identificar se isso está acontecendo: verifique o seu dia-a-dia e identifique situações onde sua reação foi desproporcional a um fato ocorrido. Isso não é tudo mas frequentemente é um bom indicador. Se a sua reação diante de determinadas circunstâncias é sempre desproporcional ao fato, você não está reagindo ao fato e sim ao “fantasma” de um sentimento (do passado) gravado em suas lembranças. Isso pode ocorrer no trabalho, nas relações sociais – amizades, família, mas é freqüentemente bem mais perceptível (e pernicioso) nas relações afetivo-sexuais duradouras.
Sendo um pouco mais cru e direto: são esses “fantasmas” os responsáveis por provocar a maioria das separações de casais. Por quê? Porque a presença desses “fantasmas” faz com que o casal não se relacione entre si e sim cada um dos componentes se relaciona com um (ou mais) de seus próprios fantasmas.
Um exemplo prático? É comum que a esposa, sempre que o marido se mostre irritado, diga (quase gritando): – “Não grite comigo!”. Essa esposa praticamente antevê o marido gritando através de um “fantasma” que está no seu passado. Nesse exemplo a esposa reage apenas dizendo para o marido não fazer algo (gritar) porém ela pode reagir de outras formas – mais fortes, contundentes, agressivas, ou se inibir, se magoar, deprimir-se – diante desse grito-fantasma que nunca existiu (provavelmente vez ou outra você lê em um jornal um assassinato por uma “fechada” no trânsito!!! desproporcional, não?). Isso é reviver uma situação do passado e o “sangue ferve”.
Na psicoterapia de casal (terapia de casais) esses fantasmas praticamente se materializam – se fazem presentes – e podem ser vistos (identificados) com maior facilidade. Não é incomum que alguém use expressões como: “fiquei fora de mim” ou “não sabia o que estava fazendo” ou mais simples como: “extrapolei”. Defrontar-se com os próprios “fantasmas” é uma forma de tirar o seu poder; desmascará-los (tirar o seu lençol) elimina seu domínio o que nos permite olhar e ver novamente o companheiro(a) que escolhemos e, a partir daí voltar a nos relacionar com ele(a).
Acontece que tirar o lençol desse fantasma pode nos deixar momentaneamente nus. Pode ser desagradável para algumas pessoas, principalmente diante do(a) companheiro(a). Entra aqui a questão: até onde pode ir a terapia de casal quando feita com a presença de ambos os cônjuges? Não há uma regra já que a questão passa: a) pelas características individuais e b) pelo desenho sob o qual se estabeleceu a relação. Note que não estou discutindo a questão de “segredos” intra casal e sim os limites de cada um em relação à sua imagem diante do outro.
É em função disso que sugiro a psicoterapia individual pré-terapia de casal sempre que um dos cônjuges seja mais sensível e já preveja a existência de “fantasmas” inibidos ou assustadores.
Para quem não acredita em “fantasmas” eu alerto: – “Você pode não acreditar… pero que los hay, los hay!”.
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